Não sei falar pelas dez mães que perderam seus filhos na tragédia do Fla
Desculpa, mas não sei o que escrever. Não sei enaltecer o gol santista no último instante. Nem Jean Mota, Cueva, Sampaoli. Não sei criticar o bom Soteldo pelo gol perdido. O inacreditável gol perdido. Falar sobre Pelé, Neymar, Robinho. Tudo é pequeno demais perto do que aconteceu na sexta. Qualquer assunto é pequeno demais. Nós somos pequenos demais.
Não sei falar pelas dez mães que perderam seus filhos. O quarto vazio. A gaveta cheia de cheiro e carinho. Não sei falar pelas paredes que ficaram, os travesseiros que ficaram, os abraços que ficaram. As roupas. Os sonhos. Não sei falar sobre o menino que faria aniversário no sábado. E daria o primeiro pedaço de bolo pra mãe. Não sei falar de bola quando meu rosto não sorri. Muito pelo contrário: chora.
Não sei falar sobre os sonhos que eles tiveram. Ainda que sejam os mesmos que os meus, um dia. Não sei falar sobre os arrepios que sentiram no primeiro teste, os desafios nesse curto espaço de tempo, o que pensavam. Como treinavam. Não sei falar de adolescentes no passado verbal. Não sei falar por eles. E não pretendo. E não acho justo escrever sobre os gols que saíram no final de semana.
Sei falar que não era para ninguém jogar. São Paulo, Salvador, Porto Alegre. BH, Manaus, seja lá o que for. Não era para disputar no final de semana. Era para abraçar. Apertado. Chorar junto. De mãos dadas. Era para pensar junto. Demonstrar carinho. Criar carinho.
Não sei escrever pelos que ficaram. Nem dizer pelos pais dos que escaparam. Não sei chorar o mesmo choro de ninguém. Meu sentimento é de impotência. Eu não sou ninguém. O futebol é muito pequeno. Títulos, brigas, carrinhos. Abraços são grandes. Mas rápidos. Discussões duram mais tempo do que abraços. E podem não terminar nunca. Sei escrever que também morremos ali. Todo mundo morreu um pouco.
A provável eliminação do São Paulo é pequena. O pouco futebol do Corinthians. A derrota do Palmeiras no clássico é pequena. Os milhões por Gabigol e Arrascaeta. Todos os campeonatos possíveis. As vitórias, empates, derrotas. Zico é pequeno. Adilio é pequeno. Andrade é pequeno. Todos que nasceram no Ninho são pequenos. Todos nós somos pequenos.
Não sei o que falar. Somos tão pequenos que chutamos enquanto choramos. Criticamos enquanto choramos.
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